Capítulo 7 - O espaço para o novo
O novo, muitas vezes, pode parecer igual, ou até mesmo ruim, mas pelo menos é novo. O que vale é a jornada de sair daquele lugar conhecido para explorar algo inusitado. Então, lá fui eu me abrir ao novo! Não era apenas pela necessidade de experimentar e testar o diferente. Havia um componente importante de analisar o que cada nova experiência reverberava em mim.
O que eu fazia como trabalho passou a não ser a principal coisa para mim pela primeira vez em muitos anos. Quebrei paradigmas e trabalhei de garçonete a animadora de festa. Voltei a ser aprendiz e, ao mesmo tempo, ensinar – duas coisas que adoro. Foi aí que entendi que podemos ser muita coisa quando entendemos que não precisamos estar mais em caixas ou escolher rótulos.
Já sabia que não eram somente questões profissionais que deveriam estar no foco, pois assim eu estaria trocando seis por meia dúzia. Equilíbrio era a palavra que daria norte a esse caminho. Por isso, priorizei ter tempo para mim mesma; não só para poder me reconectar com minhas antigas paixões, mas também descobrir novas. Perguntei a mim mesma...
Qual foi a última vez que você se abriu ao novo?
A escrita, que sempre teve um espaço significativo desde meu primeiro ano da escola, passou a ter não só uma presença mais forte em minha vida, mas também um maior significado. As folhas em branco se tornaram fiéis companhias nos cafés de cada manhã. Nelas, passei a registrar cada passo da minha jornada como forma de refletir o que vivenciava. Colocar tudo que estava acontecendo em palavras concretas no papel e tirar muita coisa da minha mente sempre ocupada me ajudou a me sentir menos sobrecarregada e atordoada.
Ao mesmo tempo em que esvaziava o barulho da minha mente, a escrita também me trouxe a oportunidade de não apenas agir ou reagir automaticamente ao que acontecia à minha volta. Eu tinha tempo para parar e enxergar as situações sob novos ângulos e diferentes perspectivas.
Voltar a surfar foi outra paixão que reacendeu dentro de mim. O contato com a natureza sempre me fez bem e estar no mar me fazia sentir ainda mais parte dela. Mesmo morando muito tempo em cidade grande, posso contar nos dedos os finais de semana que passei na capital. Pegava a estrada religiosamente toda sexta-feira em direção à chácara de meus pais no interior ou à casa de praia no litoral paulista para aproveitar meu tempo livre longe do céu cinza e da vista de concreto.
Foi literalmente caindo muito na água que o surf começou a representar muito mais para mim. Levava para a água minha frustração, ansiedade e as minhas inúmeras dúvidas e incertezas. Eu projetava nas ondas a esperança de vencer tudo aquilo e, quando achava que já havia domado o oceano, era surpreendida por mais um belo caldo. E lá estava eu, remando com toda a força na tentativa de vencê-lo novamente.
Como não há maneira de se parar uma onda, eu também não podia controlar o não aparecimento ou o sumiço daqueles sentimentos dentro de mim. O que vim a entender é que estava em minhas mãos escolher a forma com a qual reagiria a tudo aquilo. Poderia sair do mar mais uma vez de cabeça baixa por não ter dropado nenhuma onda, como fiz muito no início, ou parar de me cobrar por isso.
O mar me ensinou que, independentemente do tamanho da onda que eu dropar, a sensação de bem- estar ao me jogar na água com minha prancha rodeada por aquele cenário de tanta vida é insubstituível. Era sobre encontrar aquele estado de flow ao me colocar por inteira no momento, fazendo algo que me dá prazer, e deixar fluir, possibilitando que a água do mar lavasse toda aquela confusão dentro de mim.
O mar me reconectou com minha criança interior, uma etapa em que não deixávamos que nossos pensamentos bloqueassem nosso agir ou falar. Quando crianças, éramos mais espontâneos e menos racionais. Em nosso jardim de infância, não tínhamos pensamentos moldados por paradigmas e, por isso, agíamos de forma mais intuitiva.
Juntamente com essa espontaneidade, vi também a criatividade ressurgir em mim. Curioso é que nunca duvidei do meu potencial criativo, muito menos passou pela minha cabeça ter, de alguma forma, perdido isso. Apenas acabei deixando a criatividade de lado na minha lista de prioridades com tantas coisas para fazer; pensar em arte virou luxo. Mas, sempre soube que ela estava ali, apenas adormecida, esperando meu chamado novamente.
Sou daquelas que acreditam que todos somos seres criativos, de uma forma ou de outra. O que nos diferencia é o quanto continuamos nutrindo essa habilidade em nós ao longo de nossas vidas. Para mim, a criatividade é tão importante que o fato de não trabalhá-la sempre acarretou um bloqueio em outras esferas de minha vida: eu precisava liberar isso. O escrever com certeza me ajudava, mas eu ainda sentia aquela vontade de fazer arte como quando criança.
Acabei me inscrevendo em um workshop de fotografia. No entanto, o que me encantou mesmo foi um curso para aprender a fazer joias. Em meio a um ambiente em que as pessoas respiravam criatividade, eu sentava na minha banqueta e era como adentrar em um outro mundo. Ter inspiração, criar, desenhar, cortar, moldar, soldar... Enfim, ver esse processo de transformação de um pedaço de metal ganhando forma e se tornando algo tão belo aos olhos me conquistou. Era a forma mais poética de dar vida às ideias que eu já havia presenciado e, por mais que eu desenhasse, calculasse e planejasse, sempre acabava surpreendida pelo resultado final.
E foi assim, entre sessões de surf, aulas de fotografia, escritas no café da manhã e horas criando joias, que fui me reconectando com minhas paixões e meus talentos, me abrindo e me redescobrindo novamente. Sem rótulo, identificação, julgamento ou pressão. Prazer, sou Kelly e, no momento, uma exploradora do novo.
Prazer em conhecê-la, Kelly!